Dia Mundial do Refugiado: estudos abordam relação entre proteção social, crianças, refugiados e deslocados internos
Por Lucas Sousa, Estagiário de Comunicação*
Brasília, 19 de junho de 2019 - O Dia Mundial do Refugiado, celebrado em 20 de junho, traz à reflexão um triste recorde: 70,8 milhões de pessoas foram forçadas a deixar suas casas por causa de guerras, perseguições e conflitos, em 2018, de acordo com Agência da ONU para Refugiados (ACNUR). Trata-se do maior índice de deslocamento forçado registrado em quase 70 anos de trabalho do ACNUR. Segundo o relatório Tendências Globais (Global Trends), divulgado pela agência, o número de pessoas em situação de deslocamento forçado dobrou em 20 anos, é 2,3 milhões maior que a cifra registrada em 2017 (68,5 milhões) e equivale às populações de países com Tailândia e Turquia.
O Relatório destaca que mais da metade, ou 41,3 milhões de pessoas, é composta por deslocados internos (ou IDPs, na sigla em inglês), que são pessoas forçadas a deixar suas casas, mas que continuam em seus países. Já 25,9 milhões são refugiados, ou seja, pessoas forçadas a sair de seus países por causa de conflitos, guerras ou perseguições. E 3,5 milhões são solicitantes de refúgio, que são pessoas fora de seus países de origem recebendo proteção internacional enquanto aguardam a decisão de seus pedidos de refúgio.
No Brasil, existem atualmente 5.314 refugiados residentes, conforme a base de Refugiados no país fornecida pela ACNUR, pela Polícia Federal brasileira e pelo Ministério da Justiça. De acordo com a Pesquisa "Perfil Socioeconômico dos Refugiados no Brasil", patrocinada pelo ACNUR em parceria com a Cátreda Sérgio Vieira de Mello, o Brasil é descrito como um país receptivo, de emissão (emigração) e também de passagem. E o que faz o refugiado querer ficar no Brasil? Segundo a pesquisa, os fatores determinantes são o sistema de saúde (SUS) e sistema educacional (Ensino Fundamental, Ensino Médio e Ensino Superior), por serem sistemas públicos e gratuitos.
Segundo dados da pesquisa, os refugiados já residentes no Brasil possuem direitos como todo cidadão brasileiro nato, excluindo o direito de votar e ser votado, por não serem cidadãos natos e sim, naturalizados. Apesar de possuírem direitos como documentação, possuir renda e moradia, acesso ao sistema financeiro brasileiro, ainda existem muitos refugiados que enfrentam obstáculos e dificuldades para serem elegíveis para programas de proteção social.
Fato é que, além de enfrentar dificuldades inerentes aos processos migratórios, refugiados e IDPs também se encontram em posição vulnerável em relação aos programas de proteção social em todo o mundo. Como não nacionais, os refugiados muitas vezes não são elegíveis para programas de proteção social em outros países. Da mesma forma, o deslocados internos, geralmente, perdem o acesso aos benefícios devido à falta de portabilidade dos mesmos. Trata-se de uma questão global de direitos humanos. Os refugiados necessitam da assistência de programas de proteção social, um dos principais temas de pesquisa do IPC-IG. O tema perpassa estudos que discutem políticas públicas na Ásia, no Oriente Médio e na África, entre outras regiões.
Para comemorar a data, que busca promover a conscientização pública e o apoio às pessoas que tiveram que fugir de suas terras por causa de conflitos, perseguições ou desastres naturais, selecionamos quatro publicações recentes que abordam diferentes dimensões da relação entre os temas de proteção social, crianças, refugiados, migrantes e IDPs.
- Revista Policy in Focus (PiF) intitulada "Proteção social: atendendo aos direitos e às necessidades das crianças" aborda o papel da proteção social no combate à violência infantil e na promoção de uma transição segura para a vida adulta. Dois artigos imperdíveis da revista discutem o uso de transferências de renda para apoiar crianças deslocadas na Jordânia e no Líbano e examinam a pobreza e a vulnerabilidade das crianças no Iraque, onde uma série de choques políticos e humanitários levou ao deslocamento interno de milhões de pessoas
- O Relatório "Construindo Sistemas Nacionais de Proteção Social Responsivos a Choques na região do Oriente Médio e Norte da África (MENA)" analisa oito países que enfrentam diferentes riscos com distintos níveis de capacidade institucional: Egito, Estado da Palestina, Iêmen, Iraque, Líbano, Jordânia, Síria e Sudão. A proteção social é reconhecida como um importante instrumento de política pública para abordar impactos idiossincráticos, mas recentemente vários estudos têm procurado investigar como os sistemas de proteção social também podem ser resilientes e responder a impactos covariantes. Um sistema de proteção social pode ser definido como sensível a impacto quando "pode responder com flexibilidade no caso de uma emergência" que afeta um grande número de pessoas e / ou comunidades de uma só vez, em vez de impactos como a morte de um chefe de família , o que pode afetar indivíduos ou membros da família.
Entre os resultados, o estudo apontou que a grande crise de refugiados e o número de IDPs na região acentuam os desafios para a coordenação entre os atores humanitários e de proteção social. No geral, os desafios surgiram em termos de harmonizar a prestação de serviços em diferentes intervenções, uma preocupação distinta para os países anfitriões de refugiados. O Iraque é o único país analisado onde o direito a iniciativas nacionais de proteção social é concedido a não-nacionais. No entanto, esse acesso é limitado na prática;
- O estudo "Overview of non-contributory social protection programmes in the MENA region through a child and equity lens" ( "Visão geral dos programas não-contributivos de proteção social na região MENA sob uma ótima sensível às crianças e equitativa") indica que os sistemas nacionais de proteção social muitas vezes não são nem abertos nem preparados para fornecer apoio a crianças não-nacionais. Analisar o tema pelo viés das crianças e dos direitos humanos é essencial, pois os mais jovens são, particularmente, afetados por processos migratórios e, em geral, programas de proteção social não estão preparados para ajudar a crianças estrangeiras.
- A Revista PiF "Social Protection after the Arab Spring" ("Proteção Social depois da Primavera Árabe") destaca, entre outros pontos, que a assistência e seguridade social não podem ser transferidas entre países. Com isso, os refugiados costumam perder o acesso a estes benefícios quando precisam abandonar suas casas. Assim, muitas vezes excluídos do acesso a recursos do governo, a maioria dos refugiados na região do MENA precisa da ajuda de agências humanitárias. Nesse cenário, entre os países que receberam um grande fluxo de refugiados na região, apenas a Turquia abriu seus programas nacionais de proteção social aos refugiados. Outros países não puderam fazer isso por possuírem um sistema de proteção social rudimentar ou por não estarem dispostos a disponibilizar recursos estatais para pessoas que não eram cidadãos nacionais. Como resultado, a proteção social para refugiados na região é fornecida, em sua maioria, por agências internacionais, em forma de transferências financeiras humanitárias.
* Sob supervisão de Denise Marinho dos Santos, Oficial de Comunicação