Nova Policy in Focus examina mudanças e desafios para a proteção social pós  COVID-19

Por IPC-IG

 

Unicef Ethiopia

 

A proteção social em todo o ciclo de vida é o assunto da primeira seção da última edição da revista Policy in FocusWhat’s next for social protection in light of COVID-19: challenges ahead”.


Durante a e-Conference global “Turning the Covid-19 crisis into an opportunity: What’s next for social protection?” ocorreu um conjunto de 14 mesas redondas, em que especialistas e decisores políticos se reuniram para falar sobre benefícios universais para crianças; proteção social responsiva ao gênero; programas sensíveis à deficiência; vulnerabilidade do idoso; e proteção ao desemprego, entre outros temas. Os artigos refletem uma visão atualizada das discussões temáticas realizadas ao longo dos quatro dias da conferência.


No primeiro artigo, “Universal child benefits: The pathway to universality in COVID-19 times”, David Stewart, Atif Khurshid e Aristide Kielem demonstram como a COVID-19 tem um impacto profundo na pobreza infantil. Os efeitos podem ser tanto imediatos quanto duradouros - o que afeta as crianças agora terá um impacto direto nas sociedades e economias nos próximos anos, à medida que se tornarem a próxima geração de adultos.


Nesse sentido, o artigo apresenta as razões para se considerar benefícios universais para crianças (UCBs), independentemente do bem-estar ou nível de renda do domicílio. Apesar de as questões de economia política relacionadas à cobertura e ao financiamento serem de extrema importância, os UCBs são mais viáveis e acessíveis do que parecem à primeira vista, especialmente quando a realização progressiva é considerada; uma implementação gradual pode ser um caminho muito viável para a universalidade.


Em suma, os autores destacam que “nenhuma criança deve ver seu potencial não realizado devido à falta de uma pequena quantia de recursos financeiros no domicílio; este é, entretanto, o caso de centenas de milhões, talvez mais de um bilhão, de crianças”.


Mulheres e meninas também foram afetadas de forma desproporcional pelos impactos socioeconômicos da pandemia, desde aumentos espantosos nas responsabilidades de prestação de cuidados não remunerada até a pandemia oculta da violência de gênero.


De acordo com Clare McCrum, no artigo “Gender-responsive social protection in times of  COVID-19”, apesar da evidência dos impactos socioeconômicos e da carga de tarefas relacionadas à prestação de cuidados – não remuneradas -   sobre as mulheres, de acordo com um mapeamento da ONU Mulheres e do PNUD, apenas 18 por cento das respostas de proteção social foram sensíveis ao gênero - direciondas a segurança econômica das mulheres ou ao aumento da carga de cuidados.


A autora levanta a questão: “O que permite e bloqueia a proteção social responsiva ao gênero, e o que precisamos fazer para nos preparar para a próxima crise?”.


Ela explica que, em tempos de crise, escala e velocidade são frequentemente os dois únicos objetivos dominantes de políticas, deixando os demais fatores em segundo plano. Quando sistemas não consideram questões de gênero em circunstâncias 'regulares', eles não considerarão o gênero durante uma crise. No entanto, se as reformas necessárias não forem implementadas, esta crise acontecerá novamente, e novamente as mulheres e meninas perderão renda e educação, pois estão financeiramente desprotegidas enquanto continuam a suportar a carga desproporcional do trabalho que envolve a prestação de cuidados, essencial para a manutenção de nossos lares, comunidades e economias.


Para a autora, estamos diante de um problema de economia política em vez de um desafio técnico. O gênero é importante em todos os elementos do desenho da proteção social: quais instrumentos são priorizados, quem se qualifica para receber apoio, como os programas são financiados, como são executados e quem é consultado em relação a essas decisões. É necessário colocar as necessidades das mulheres e meninas no centro das atenções nas reformas de proteção social e nos esforços de recuperação econômica.


Alexandre Cote, do Inclusive Social Protection Project da UNPRPD / OIT / UNICEF, aponta no artigo “Bridging the disability inequality gap: Changes needed for an inclusive COVID-19 response and recovery” que a crise de COVID-19 ampliou os obstáculos e desigualdades enfrentadas pelas pessoas com deficiência, visto que são particularmente vulneráveis devido a uma combinação de maiores riscos relacionados à saúde, perda de renda e interrupção dos sistemas de apoio formal e informal.


O papel dos sistemas de proteção social para pessoas com deficiência também está em discussão, uma vez que muitas vezes se concentra na incapacidade dos indivíduos para trabalhar, em vez de apoio em sua inclusão.


Historicamente, os principais sistemas de proteção social relacionados à deficiência têm sido a compensação por perda ou falta de capacidade de geração de renda, o que cria um dilema desafiador para as pessoas com deficiência: qualquer tentativa de se envolver em atividade econômica, que é sempre arriscada, pode resultar na perda da única fonte estável de renda do lar. O foco único na incapacidade de trabalhar cria uma divisão entre quem pode e quem não pode trabalhar, e contribui para perpetuar o preconceito.


A crise de COVID-19 mostrou a importância de um sistema de informação que inclua as pessoas com deficiência, combinando de maneira ideal os registros únicos e os de deficiência. Com o progresso da digitalização, a avaliação de deficiência pode ser realizada com maior confiabilidade em nível comunitário e pode alimentar automaticamente os registros a serem usados para o gerenciamento de casos, bem como para o planejamento de políticas públicas.


Os idosos também enfrentam perigo especial devido à COVID-19, já que o risco de doenças graves e morte aumenta com a idade. De acordo com Florian Juergens, Usa Khiewrord e Aura Sevilla, no artigo “Older people’s income security and access to social protection during COVID-19 and beyond”, em países com cobertura de pensão limitada, a pandemia piorou ainda mais a já frágil situação econômica dos idosos.


Com poucas oportunidades de trabalho e limitada cobertura de pensão, a maioria dos idosos depende de suas famílias para sobreviver. As pensões são cruciais para a redução da pobreza e para o desenvolvimento humano, e assim continuarão após a COVID-19.


As pensões sociais também garantem que as desigualdades de gênero, como as disparidades salariais entre homens e mulheres, não sejam replicadas em períodos posteriores da vida e que todas as mulheres tenham acesso a uma pensão adequada em idade avançada. Experiências e pesquisas globais demonstram que as pensões sociais universais são acessíveis mesmo em países de baixa renda, e que níveis de transferência relativamente modestos têm grandes impactos.


A crise da COVID-19 também impactou fortemente o mercado de trabalho e expôs amplas desigualdades em termos de proteção às perdas de renda. Em muitos países, os sistemas de proteção ao desemprego desempenharam um papel crítico na resposta à crise, apoiando negócios na retenção de trabalhadores, evitando assim o desemprego e proporcionando segurança de renda para aqueles que perderam seus empregos.


Para Céline Peyron Bista, Quynh Anh Nguyen e Maya Stern-Plaza, no artigo “Extending unemployment protection as a response to the COVID-19 crisis and as part of efforts to build back better”, os países precisarão, no futuro, partir de medidas emergenciais para mecanismos de segurança de renda mais sustentáveis para trabalhadores que perdem seus empregos,  aliadas a medidas que faciliem o retorno a empregos decentes, pautados nos direitos humanos e nas normas internacionais do trabalho. Sistemas eficazes de seguro-desemprego precisarão fortalecer as medidas de apoio ao trabalho, mas também acelerar a transição da economia informal para a formal.

 

Foto: UNICEF Ethiopia/2020/NahomTesfaye 

 

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